David Machado é um reconhecido escritor português, autor de
vários romances e livros de literatura infantil. Já recebeu alguns prémios e no
ano passado viu o seu romance "Índice Médio de Felicidade"
adaptado ao cinema.
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e sabe mais sobre a sua vida.
ENTREVISTA AO ESCRITOR
Revista Estante - FNAC.
O que é para si um bom livro?
Um livro que me faz pensar. Se
chegar ao final do livro e não tiver perguntas, esse livro é um livro falhado.
Se só me der respostas, não serve para nada. Não preciso de respostas. Quero um
livro que me dê perguntas. Acho que um livro tem sempre de ter espaço para que
o leitor o preencha com as suas próprias emoções, os seus pensamentos, a sua
experiência. Um livro que não deixa esse espaço não serve mesmo para
nada.
Qual foi o último livro que
leu e o que achou dele?
Foi um livro de uma escritora
inglesa, Ali Smith, que acho que ainda não está publicado em Portugal.
Chama-se How to Be Both. Achei extraordinário.
Incrível, mesmo. É uma referência a várias coisas: como conseguimos ser velhos
e novos, homem e mulher dentro da mesma pessoa, estar aqui hoje e termos dentro
do corpo todas as memórias e experiência dos nossos antepassados. Como
conseguimos viver neste tipo de equilíbrios. E é um livro que tem muito a ver
com a arte. O que é? O que vem primeiro e depois? Se olharmos para um quadro,
somos nós que lhe damos sentido ou foi o pintor? É muito, muito bom.
Costuma planear todos os
detalhes do que escreve ou deixa-se levar pelo momento?
Eu penso muito antes de
começar a escrever. Quando começo finalmente a escrever o texto, sei muito bem
para onde quero ir. Não quer dizer que depois vá por esse caminho. Normalmente
até não vou. Isso é aquilo que é mais estimulante na escrita: chegamos a
lugares do nosso pensamento aos quais não chegaríamos só a pensar. A associação
de palavras e a frase escrita à nossa frente normalmente despertam outro tipo
de ideias. Mas quando me sento, normalmente tenho uma série de lanternas que me
vão iluminando o caminho. Não quer dizer que saiba necessariamente o final da
história, mas sei mais ou menos para onde é que aquilo me leva.
Que título daria a um livro
sobre a sua vida?
Só me lembro de um título que
uma vez me apareceu na cabeça para um possível romance mas que eu gostava que
fosse o título do livro da minha vida: Vida Mais Longa. Pelo
simples facto de que queria dizer que eu ia viver muito. E eu gosto de viver.
Como lhe surgiu a ideia
de Índice Médio de Felicidade?
A ideia original era escrever
sobre três amigos e tinha mais a ver com o suicídio, com alguém a quem as
coisas não estão a correr bem e quer desistir. Depois, à medida que fui
construindo as personagens, esta questão da felicidade meteu-se porque, na
verdade, é um tema que me é muito próximo há muitos anos. Acabou por se tornar
um livro sobre um homem em crise em tempos de crise, o que o leva a questionar
tudo: a sua própria vida, a felicidade, os planos para o futuro, a sua
esperança, os seus valores e se vale a pena continuar, o que tem a ver com a
ideia inicial que eu tinha. Acabou por ser um ponto de encontro entre vários
temas e ideias: a felicidade, o altruísmo, a crise económica…
Qual é a pior parte de ser
escritor?
Tem a ver com a questão do
retorno monetário. O nosso país é muito pequeno e as pessoas não leem tanto cá,
não compram tantos livros como em outros países pequenos. Por exemplo, na
Holanda vendem-se muitos livros e eles até são menos que nós. É difícil viver
dos direitos de autor. Por muito que eu goste de ir falar às escolas e dar
entrevistas, preferia fazer menos tudo isso e ter mais tempo para dedicar aos
livros. Mas não tenho muitas queixas em relação ao meu trabalho. Adoro o que
faço. Sei que sou um sortudo.
Que conselhos dá a
eventuais aspirantes a escritor?
O que costumo dizer nas
escolas aos miúdos é que, antes de mais, têm de ler. E têm de ler muito. Acho
que há muita gente que quer e gosta de escrever, mas não lê muitos livros e não
lê diferentes tipos de livros e não tenta ler livros que sejam mais exigentes
do que o tipo a que estão habituados. E depois é preciso escrever muito. Há
muita gente que escreve um conto ou dois e fica logo satisfeito, a pensar que
poderia publicar qualquer coisa. Temos de escrever 20, 30, 40 contos. Temos de
escrever três romances até acertarmos. Não fiquem satisfeitos à primeira. É
importante falhar para percebermos como podemos fazer melhor.
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